domingo, 3 de janeiro de 2021

2021 - Ano em que atinjo a maioridade.

 Neste ano 65 vamos ver como corre o recomeço.

Depois dos problemas em Itália, e quando estava a tentar o regresso, surge este maldito virus e os desafios de 2020 ficaram todos na gaveta.

2021 está aí para o recomeço. Vamos ver o que se consegue fazer.

Fevereiro - Sicó 111

Junho - TPG - 170

Junho - Freita - 100

Julho - Trail de france - 380

Agosto - PTL - 300

:::::

Tenho de começar a treinar...

sexta-feira, 19 de maio de 2017

TRANSGRANCANARIA 360º

TRANSGRANCANARIA 360º
A PROVA QUE TINHA TUDO PARA CORRER MAL

Alguns dias depois de terminar a Transpyrenea e com as mazelas ainda frescas, fui desafiado a fazer a inscrição numa nova aventura lá para Fevereiro. Ainda não andava direito, mas nem hesitei e quando dei por mim já estava inscrito.
Uns dias depois e a seguir à participação numa prova de 20 km no Valado, apareceu-me uma dor que, aos poucos, se tornou cronica. Poucos treinos fiz, e provas foram-se fazendo algumas quase sempre com sofrimento no tornozelo do pé esquerdo. Mas estava inscrito e por isso iria estar presente na linha de partida para ir até onde o pé me deixasse. Sabia que não podia abusar pois os iria ter muitas horas pela frente depois de 6 meses quase sem treinos.
Mas à hora marcada lá fui com a Célia para a linha de partida para as fotos da praxe do grupo dos portugas presentes.

É chegada a hora e depois do tiro de partida não há volta a dar-lhe – vamos lá correr. Saio bem, num trote a um ritmo confortável ficando num segundo grupo que se manteve ao longo de todo o canal e até à entrada por trilhos no meio do canavial. Alguns pequenos enganos, mas com relativa facilidade encontrávamos o rumo certo. Foi um bom inicio de habituação à navegação GPS.
A concorrência era forte
Entretanto chega-se a nós o José Mota aumentando o grupo que seguia em fila pelos trilhos a subir. Eu mantinha-me colado à cauda do grupo. Neste grupo seguia também nas calmas o principal candidato à vitória e que seguia aqui como se correr não fosse nada com ele. (Viria a ser uns dos primeiros). O José Mota ganha algum avanço na subida, mas ao virarmos por um trilho técnico na direcção da primeira aldeia, consigo chegar-me a ele. Aproximamo-nos de São Bartolome de Tirajama ao inicio da tarde e com muito calor. Uma paragem no centro da vila, para uma primeira cerveja, que a seguir adivinhava-se uma empreitada difícil. Tínhamos mais de 1000 m D+ em cerca de 5 km. Mas o problema não eram os 1000 d+, mas a dificuldade técnica da subida. Era só o sinal do que estava para vir.
Presente... para a partida.
Pouco a pouco lá fui subindo, chegando lá a cima sozinho. Ao chegar tenho 4 estradas, vejo fitas para a esquerda e nem hesito, começo a seguir as fitas. O triho agora era bom e dava para correr. Ao fim de algum tempo começo a desconfiar da sorte e decido ligar o gps. Puta da sorte, já não vejo o trilho, vamos para trás. Quando avisto o trilho certo começo a ver o pessoal que vinha atrás e lá sigo a descer a caminho da primeira base de vida. Começa a chover e ao entrar na base de vida o nevoeiro vai-se adensando. Está feita a primeira etapa.
O José Mota já está quase de saída da BV e eu vou aproveitar para comer com calma e descansar um pouco. Fiz uma paragem de cerca de 1 hora e à saída da sala somos surpreendidos pela chuva e frio que se faz sentir na rua. Visto impermeável e luvas e sigo sozinho o meu caminho. Um pequeno engano que serviu para me juntar a um grupo que me irá acompanhar durante algumas horas a caminho da Aldeia onde se situa a 2ª base de vida. Sigo ora na cauda ora na frente deste pequeno grupo. Num dos momentos em que comandava seguimos pelo trilho errado cerca de 100 m e ao voltarmos, agora na cauda, os
companheiros de jornada, em vez de viraram para o trilho correto seguiram no sentido inverso. Digo-lhe que vão mal mas não me entendem e eu volto para o trilho certo, sabendo que eles depressa se dão conta do erro e me vêm apanhar. Numa descida de pedra solta sou surpreendido por um escorregão devido ao rolamento das pedras debaixo dos pés e dei varias voltas a rebolar por ali abaixo. Quando eles me apanham ainda estava sentado a avaliar os estragos. Uma ferida na mão estava feia e ia deixando rasto de sangue. Vamos fazer uma descida perigosa até Morgan onde encontramos elementos da protecção civil, que não tinham nada para me tratar as feridas. Atá água para uma lavagem da mão tiveram de ir pedir a uma casa ali perto. Sigo até ao centro da aldeia para onde já tinham seguido os meus companheiros e, enquanto 3 deles não pararam, o italiano fui encontra-lo na tasca já com a cerveja à frente. Era 1 da manhã e aquela hora já só gente da noite estava por ali. Sento-me ao balcão e o sr da tasca, ao ver a minha mão arranjou logo betadine e ligaduras para fazer curativo. Peço uma cerveja e um pratinho de tapas (mistura de grão com padacitos de carne).
Depois de abastecer partimos, mas depressa o italiano começou a ficar para trás. A subida inclina e decido esperar por ele. Como nunca mais chegava voltar para ver o que se passava. Vou encontrá-lo já deitado para o descanso. Continuo sozinho montanha acima decidido a dormiscar mais para a frente. Ao começar a descer para uma pequena aldeia (Veneguera) procuro por um local para acantonar. À entrada encontro um banco óptimo, numa paragem de autocarro, onde monto o meu acampamento para menos de 1 hora de descanso. Enquanto durmo vão passando alguns atletas.
Depois do descanso ponho-me a caminho ao som do cantar dos galos. Pensava que poderiam faltar cerca de 12 a 15 km até à BV e depois de cerca de 1 km quase plano avisto vários frontais na subida o que me dá sempre uma adrenalina extra. Vou alcançá-los antes de chegar a uma estrada asfaltada lá no alto. Depois de cerca de 100 m voltamos a um trilho paralelo ao alcatrão e começamos a avistar luzes ao fundo. Será a BA? Lanço-me por ali abaixo a grande velocidade e finalmente entro na aldeia (Tasarte), mas BA nem vela. Voltamos a uma subida até aos 700 m e entramos numa estrada asfaltada bastante estreita que vamos descer por cerca de 2 km. No vale à nossa direita vemos as luzes da povoação lá bem ao fundo, mas não havia forma de descer para lá. Vamos perdendo altitude a pouco e pouco mas ainda estamos muito altos. Saímos do alcatrão e para um estradão que quase seguia as curvas de nível. Sou apanhado por 2 atletas locais que conheciam o percurso e me dizem que ainda temos de dar uma volta de alguns kms até atingir a BV. Passamos no meio dos celebres parrais (grandes estufas) e só depois iniciamos a descida de verdade até ao colégio onde estava instalada a BV em La Aldea. Antes de chegar à base ainda alcanço um grupo onde estava a Dinamarquesa também emissário de Andorra.
A BV estava animada por um grupo muito grande de voluntários e alunos do colégio. Tento fazer um curativo da ferida da mão, mas não havia ninguém para apoiar. Apenas nos forneceram betadine. Os pequenos alunos da escola iam fazendo trabalhos relacionados com a corrida e vinha conversar com o pessoal.
Para almoçar pedi uma sopa e arroz com frango. No fim de ter comido quase tudo, acabo por vomitar o que me fez recordar que tinha de tomar omeprazol. Entretanto chega o Artur e o Gonçalo e decido ir tomar um banho e dormir 1 hora. O banho foi semi-abortado porque a água estava fria. Passou a lavagem dos pés e cara e pouco mais, a a horita de descanso foi cumprida enquanto ao lado o Artur e o Gonçalo iam arrumando as suas coisas. Despeço-me deles dizendo-lhe que seguramente me iriam apanhar pouco à frente, porque a confiança não era grande.
A subida seguinte havia de nos levar aos quase 1000 m e depois era descer 900 m até à povoação de El Risco. Consigo ultrapassar dois atletas na subida e outros 2 na descida até chegar ao bar em El Risco onde um pratinho de calamares fritos com batatas fritas serviu para recuperar aquilo que tinha vomitado na BV. Chegamos a estar 5 atletas neste bar. Entretanto o Esloveno vai embora e eu ainda fico à espera do café e da conta. Parto um pouco depois e vou ultrapassá-lo na subida… e que subida. Trilho nem velo. Tinhamos de ir escolhendo o menos mau, muitas vezes com tracção às 4, até que entramos num “canal” de rochas em que cada passo era um desafio. Chegados a um ponto critico, opto por subir pela esquerda pois vi vestígios de subida por aquele sítio. Era uma rocha enorme com pequenas reentrâncias que serviam para agarrar os pés, mas o pior foi a chegar quase ao cimo onde não tinha apoio para os pés e as mãos não tinham onde agarrar. Fico suspenso com a barriga em cima da rocha e já sem apoio para os pés e a sentir as forças dos braços a escassear. Estava nesta situação a tremer que nem varas verdes, quando o esloveno que vinha atrás consegue dar-me um empurrão aos pés, o suficiente para me conseguir arrastar para cima da rocha e alcançar uma varanda segura. Depois à que puxar o esloveno. Seleccionei o bastão que tinha reforçado com parafusos e finquei bem os pés conseguido puxá-la até lá acima. Depois sentamo-nos os dois na tal varanda com uma vista espectacular sobre o vale a acalmar da tremideira, antes seguir viagem. Foi a situação mais complicada que vivi em todas as minhas aventuras. A ‘viagem’ continuou por ali acima ainda com muitas passagens perigosas até chegar a porto seguro em subida pelo pinhal. Depois de chegar aos 1300 m iniciamos a descida e pouco depois estamos numa barragem. Descemos por algumas centenas de metros por um estradão e voltamos a entrar num trilho a descer ao longo do vale. Já é noite escura. Lá bem ao fundo vemos luzes. Depois de muito descer e à saída do trilho vejo luzes ao fundo e penso tratar-se de algum posto de controlo. Aproximo-me e vejo um casal simpatiquíssimo - Ana Y Jonay Valencia Jimenez - que esperava com água e barras e o incentivo que precisava naquele momento.
Ainda entramos num trilho junto ao rio e desembocamos na povoação de S. Pedro. Faltam 15 km para o próximo destino – BV3. Passo por um bar movimentado e não paro para comer ficando a pensar que fiz mal, porque ainda falta muito tempo para alcançar a BV. Mas cerca de 1 km à frente encontro um restaurante onde, um pouco a medo entrei. Fui bem recebido e rapidamente me arranjaram algo para comer.
Pouco mais de meia hora depois volto ao trilho e inicio a subida por uma zona lamacenta que nos havia de levar ao alto à povoação de Saucillo.  Aqui vejo finalmente ao fim de muitas horas, atletas à minha frente. Inicialmente a descida é pela estrada de alcatrão com trilhos nas curvas mais apertadas. Consigo alcançar o grupo e ultrapassá-los. Continuamos a descida acentuada, agora por estradão até à entrada da vila da Guia, onde somos desviados para o leito de um rio seco até atingir a BV3.
Nesta BV não tínhamos saco e por isso limito-me a comer e ir dormir cerca de 1 hora. Estava a dormir bem quando me foram acordar, por isso custou um bocado a sair da cama, mas o que tem que ser tem muita força. Foi por mochila à costas, comer mais qualquer coisa e marchar. Seriam umas 2:30 da manhã e seguía ao longo das ruas desertas da vila, até voltar ao mato. A próxima BV estava a cerca de 50 km e já estávamos de volta dada, por isso o ânimo começava a aumentar. Passamos por várias aldeias e descemos a um vale por meio de matagal e silva onde aparece uma mesa com dois banco e que me pareceu adequado para dormir uma sestinha matinal – é que por volta das 5h da manhã sou sempre atacado por uma soneira. Cerca de meia hora foi suficiente, e arranco logo a seguir à passagem de uma atleta que não identifiquei.
Chegamos de seguida à povoação de Moya onde um café madrugador me soube tão bem.
A subida que se segue tem como única dificuldade a lama chata que se agarra às sapatilhas e termina num piquinho onde a inclinação se acentua. Depois é só descer até à quinta do Osorio, um local de turismo com jardins bem arranjados e muito agradáveis, já nas proximidades de Teror, uma cidade de alguma dimensão. Mais uma paragem para alimentação num dos bares da cidade. Chove lá fora copiosamente. Mais umas tapas (roupa velha) e uma cerveja e estou preparado para seguir viagem. Atravessamos todo o centro urbano e iniciamos uma subida acentuada embora não muito longa. No alto uma laranja soube como mel. Seguimos nas imediações de pequenas aldeias e os kms vão passando sem ver ninguém da corrida há largas horas.
Começo a descer e pelas minhas contas não deve faltar muito para a BV5. Avisto alguem lá à frente a tirar fotos. Gritos de incentivo e ao chegar pede-me para tirar uma selfie com ele. Diz-me que faltam uns 7 km para a BV quando pelas minhas contas não deveriam faltar mais de 3. Não fico nada satisfeito com a informação e lanço-me por ali abaixo pela estrada de asfalto e só uns minutos depois decido confirmar o caminho no gps. Claro que estava errado e lá tive que subir estrada acima porque tinha de entrar num trilho à esquerda logo 100m abaixo do cruzamento. Ando cerca de 500m e encontro uma pessoa a passear um cão que me diz que faltam 800m para a BV. Duvidei e ele confirmou que sim. Afinal a informação anterior é que estava errada. E confirma-se, BV5 à vista. Agora só faltam 65 km. Finalmente faço o tratamento às feridas. Esta BV tinha um enfermeiro que me limpou minimamente a ferida e fez o seu curativo depois de um banho bem quentinho. No fim de comer vou dormir 1 hora antes de me por ao caminho. Ainda acordo antes da hora combinada para o despertar.
Saio já com o frontal preparado, visto que está a escurecer. Vai ser uma longa noite cheia de emoções.
Atravessamos as ruas da vila e descemos pelas trazeiras para um vale com bastante vegetação. Iniciamos a subida até apanhar um trilho que acompanha uma pequena ribeira ao longo de alguns km. Somos conduzidos para uma zona de muita vegetação com algumas partes complicadas, sempre junto ao leito da ribeira e às vezes sem trilho definido. Às tantas começo a ver-me entre duas enormes paredes verticais com dezenas de metros e menos de 5 m de largo. Vou ultrapassando alguns desníveis com cascatas bem bonitas. Eram difíceis, mas a subir não era muito complicado, até que chego a uma galeria com uma cascata enorme impossível de transpor. Fico uns momentos a admirar a beleza do local, mas estava sozinho, era quase meia noite, estava fora do trilho e o retorno era muito mais complicado porque as descidas eram perigosas. Mantive a calma e tentei fazer o caminho de volta o mais depressa possível para me sentir em segurança. Pouco depois lá encontrei o pequeno devio agora à minha esquerda e que não tinha visto. Era um trilho a subir bastante, nalguns sitios perigoso, mas com muita paciência, fui subindo até encontrar uma gruta cavada na rocha onde entrei e fiz uma pausa para passar pelas brasas. Este trilho estava referenciado com sendo cerca de 1 km perigoso, principalmente durante a noite. Com novo folgo depois do descanso, continuei a subida até atingir o cume acima dos 1500 metros e iniciar a descida. O sono continua a apertar e sinto necessidade de dormir mais um pouco. Estava muito frio e chova miúda. Encontro uma casa de montanha que tinha um alpendre abrigado que se mostrava adequado para estender o saco-cama e dormir. Visto toda a roupa quente que tenho e meto-me no saco, mas mesmo assim acordo um pouco depois a tremer de frio. A luta interior deu-se entre a necessidade de dormir e o frio extremo que começava a sentir. Ainda aguento um bocado, mas tive de tomar a decisão de arrancar rápidamente para evitar entrar em hipotremia. Parto com toda a roupa vestida e o poncho por cima e rapidamente recupero o calor do corpo, ainda antes de chegar à aldeia.
Vejo luzes de frontal na montanha em frente. Devem ter passado enquanto dormia. Antes de iniciar a subida dispo a roupa que tinha vestido. Tinha 400 m de desnível por trilho anunciado como perigoso e a realidade confirmava essa classificação. Chegamos ao alto e andamos em autentico corta-mato pelo meio de pedras e matagal. Encontramos uma parte marcada na descida e os frontais que tinha visto desapareceram. Nesta subida sinto várias vezes a dor no pé, o que me fez ter algum receio, por o trilho tinha algumas partes muito perigosas e esta dor repentina quando apoio deixa-me sem força.
Vou continuando a minha marcha solitária animado agora por ver luzes da aldeia lá ao fundo. Tinha cerca de 600 m de desnível até lá chegar.
Seriam cerca de 6 horas da manhã e não se via vivalma. Mas na escadaria a subir na saída da aldeia tínhamos vários cartazes de incentiva assinados pelos habitantes de Tamisas. Ainda vamos subir cerca de 200m antes de inicial a longa descida até à BV5.
Iniciada a descida de cerca de 6 km e 500 m de desnível voltei a correr e isso fez com que começa-se avistar pessoal à frente. Claro que era isso que precisava. Nunca mais parei de correr ultrapassando rapidamente os 4 companheiros que seguiam na frente. Ainda vamos passar por uma zona muito interessante onde atravessamos por um túnel debaixo da montanha e depois foi descer em alcatrão até à BV5 em Santa Luzia, junto a uma barragem.
Decidi fazer uma paragem curta de pouco mais de meia hora, só para comer e relaxar um pouco e seguir viagem. Só faltavam uns 35 km com uma subida de 600 m de desnível e depois era só ir descendo para os 9 kms finais pela praia.
Circundamos a barragem a meia encosta tendo de gatinhar por tuneis de passagem de tubagens durante cerca de 1 km, e depois iniciamos a última grande subida. Estava a sentir-me bem, por isso fui ganhando terreno em relação a 2 atletas que tinha passado atrás. Esta primeira parte da subida, embora bastante inclinada, não tinha dificuldades técnicas. Uns 2 km passados e entramos num dos “trilhos” mais complicados. O trilho em muitos sítios não existia e pedra para saltar não faltava. É necessário toda a atenção do mundo, pois um pequeno descuido é a morte do artista. Nalguns sítios tenho de parar para estudar a melhor forma de passar para o outro lado. Passamos por uma gruta e pouco depois iniciamos uma subida por cordas, que foram um auxiliar precioso. Finalmente atravessamos o cume é entramos num grande planalto, em muitos sítios sem trilho, o que nos obriga a ir olhando em permanência para o gps. Para junto ao ponto mais alto para comer a sandes de queijo que tinha trazido da BV. De seguida vou andando pelo planalto, mas aqui o percurso era monótono o que me provocou uma soneira… Tenho uma pedra ao jeito, por isso faço uma pequena sesta de 15/15 minutos e arranco atrás de dois companheiros que entretanto passaram. Como estes pequenos descansos me dão uma alma nova, depressa os ultrapasso e sigo sozinho. São cerca de 9 km com muita pedra solta e um percurso massacrante para quem já vem com 3 dias de prova. A pouco e pouco vamos perdendo altitude, até que iniciamos a descida de verdade e começamos a ver o mar ao fundo. Entramos na povoação e depressa entramos na tão desejada areia da praia.
No início ainda vamos alternando travessias pela areia e passagens nos passadiços das praias, até entrar em definitivo na areia. Tento visualizar o farol, mas tinha ainda as grandes dunas na frente e não conseguia ver nada. Apenas caminho numa passada mais ou menos rápida. Ainda ensaio um passo de corrida mas não dá. Que 9 km tão compridos.
Devem faltar uns 4 km quando olho e aparecem os dois que tinha deixado para trás há 6 horas na subida. Incentiva-me para correr e “maria vai com as outras”, lá sigo corricando com eles. Começo a sentir-me tão bem, que já sou eu a puxar pelo grupo. Depressa começamos a avistar o farol ao fundo e depois foi dar-lhe forte para lá chegar o mais depressa possível. Chegados ao farol, faltava menos de 1 km pelas ruas de Maspalomas. Continuamos o nosso passo de corrida e entramos os 3 na recta da meta cheios de força para um sprint final e gastar a energia que sobrava de 80H40 minutos passados algures pela ilha da Grancanaria. E assim termina a minha 3ª maior distância em prova e o primeiro desafio do ano.
Festa de encerramento
Desempenho muito acima do espectável atendendo aos condicionamentos todos com que parti.

19196040Serrazina JORGECA ObidosVET H180:40:28POR (Portugal)
Com dois grandes - 1º e 2º dos 85 k



sábado, 15 de abril de 2017

TRANSPYRENEA - PARTE IV

SECTOR IV
·        Com 183km
·        4 pontos de controle (CP)
·        Trilhos muito técnicos e lama nalguns locais
·        Desnível: 9000m D+ 11000m D-
·        Temperaturas amenas
·        Noite frias
·        Com chuva

Saída da BV com muita chuva que me vai acompanhar durante o resto do dia. A descida para St Engracie com chuva apresenta-se escorregadia e as minhas sapatilhas não eram as melhores para este tipo de piso. A meio da descida apanho o Daniel e seguimos os dois até St Engracie. Aqui entramos num bar junto à igreja e bebemos uma cerveja. Quando saímos fomos para o alpendre da igreja onde o Daniel tratou dos pés. Entretanto chega o Antony (apoio do Daniel) e decidem descansar por ali devido ao mau tempo. Tento ligar para a São que tinha seguido para o Logibar do outro lado da montanha para marcar a estadia, mas ela não tinha rede. Opto por seguir só. Conhecia parte da descida deste sector. Sigo, primeiro por alcatrão e depois de atravessar o rio é sempre a subir. Passo por pequenas aldeias e entro num estradão que nunca mais acaba.
O hotel de emergência - só falava o aquecimento

A certa altura vejo uma cabana numa curva e noto que tem escritos na porta. Aproximo-me e verifico que está disponível para ser utilizada por quem precise. Entro e vejo que está já 1 pessoa a dormir. Tem duas mesas de madeira com bancos corridos, um fogão e dois espaços para dormir. Descanso um pouco sentado e decido continuar porque me esperavam do outro lado da montanha.
Inscrição na porta

 Estava frio na rua e a chuva e nevoeiro complicavam ainda mais, mas tinha de ir. Siga, continuo a subir pelo estradão, até chegar a uma curva apertada, mas o gps indicava uma direcção diferente. Não via absolutamente nada à distância de 2/3 metros. Não havia trilho visto que entravamos num prado com uma descida muito inclinada. Ainda fiz várias tentativas mas não havia condições. Penso na cabana como última salvação. Sigo com o GPS ligado para conseguir voltar pelo mesmo caminho. Quando estou quase a chegar à cabana escorrego pela lama e merda dos rebanhos de ovelhas e fico com as pernas numa posição complica. Consigo levantar-me e coxear até à cabana. Entro, avalio os estragos e deito-me com toda a roupa disponível vestida. Não ligo despertador. A noite estava muito fria e não consigo aquecer, mas consegui descansar.
DIA 14
Com o nascer do dia, levanto-me e sigo o meu caminho. Volto ao local onde umas horas antes tinha “andado aos papéis” e verifico a dificuldade em encontrar o trilho mesmo com boa visibilidade. Envio mensagem para a São a dizer que já estou a descer para o Logibar. Depois daquela pequena travessia complicada, volto a entrar no estradão com cerca de 3 km planos. Saio do estradão e inicio a descida até a um cruzamento de trilhos que conheço de um treino que fiz por aqui há 4 anos. Sabia que se fosse para a direita era muito mais perto, mas o GR10 mandava-me para a esquerda, por isso é melhor não inventar. Como conhecia, sabia que ainda demorava até chegar lá abaixo. Entretanto encontro o Antony que vinha ao encontro do Daniel. Ele já tinha estado com a São e tinha-lhe falado da minha saída de St Engracie à 7h do dia anterior o que lhe provocou o aumento de preocupações.
passerelle d’Holzarte

Arranjamos um local para abancar e algum tempo depois chega o Daniel e a Jan. A São pôs os meus pés operacionais. Descanso, tomo o pequeno-almoço/almoço e como cheguei primeiro acabei por seguir sozinho, pois eles quiseram descansar mais um pouco.

Vou descendo nas calmas e finalmente avisto a tão esperada passerelle d’Holzarte, uma ponte suspensa com uma altura assustadora. 
Agora eram só mais uns 3 km a descer. A meio dessa descida dá-se o esperado encontro. A São e a Glória que quase não dormiram toda a noite, vinham a subir. A São quando me viu não se conteve em lágrimas. Tentei acalma-la e seguimos devagar até ao carro. A noite para ela foi mais dramática que para mim. Fui relatando as peripécias que vivi durante a noite e agora que está tudo bem há que descansar.


Passo pelo Logibar e começo logo a subida relativamente fácil ao largo de Larrau mas depois entramos num trilho com muita lama onde dificilmente me conseguia manter de pé. Com a ajuda dos batões ia conseguindo manter o equilíbrio, até que não houve salvação possível e tomo um banho de lama. As sapatilhas não ajudavam nada. Só no CP19 é que vi a falta da bandeira que me acompanhou ao longo de mais de 700 km.
727 km já cá cantam

O CP19 estava na estação de sky de IRATY. À chegada subimos por uma estrada de alcatrão e quando pensava que era por ali, ainda temos de fazer umas centenas de metros no asfalto. Depois de uma curva avisto a São que acabava de chegar e tinha parado o carro a cerca de 200 m do edifício onde estava o CP. Desci com a Gloria e tomei um bom almoço enquanto a São “reparava” os meus pés. Parei só o tempo necessário que não chegou a 1 hora e continuo. Pouco passa das 18 horas, por isso estudamos o mapa e combinamos ir dormir a um refugio KasKoleta que ficava a cerca de 20 km. O percurso era fácil, com pouco desnível positivo e com a decida muito gradual o que permitia ensaiar a corrida frequentemente.
Depois de atravessar um longo planalto com pedras disposta em circulo e identificadas como monumentos pré-históricos, entramos em estradões entre paredes ou vedações de cercas que parecem não ter fim. Já é de noite e acabo por ter um desvio do trilho seguindo por uma estrada paralela aquela por onde deveria ir. Quando dou por isso tento ver se é possível descer para a estrada certa, mas a descida era acentuada. Volto para trás algumas dezenas de metros e meto-me a atalhar, mas como quem se mete em atalhos mete-se em trabalho, depois de atravessar muito mato e ao chegar perto da estrada, tinha um combro de mais de 2 metros. Foi uma carga de trabalhos descer aquilo. Mas o pior é que esse ponto da estrada estava já ligeiramente abaixo de um desvio para o lado esquerdo. Segui à direita pela estrada, fui dar uma grande volta e só dei pelo erro quando chego ao cruzamento donde vinha o percurso certo. Volto a passar pelo trilho certo no dia seguinte, na repetição deste trilho.

A partir daqui era sempre a descer por um estradão que passa a estrada asfaltada. Já olhava para tudo o que era luz porque deveria estar muito perto do refúgio. Como não vejo nada continuo quase sempre correndo, mas já muito desconfiado por estar a descer tanto. Começo a ver cada vez mais perto uma vila, que sabia não existir antes do refúgio. Vejo uma pequena placa com indicação do refúgio e não reparei que tinha uma seta de indicação de direcção e penso que seria um grande edifício que existia ali ao lado. Entro no recinto, e dou uma volta pela frente do edifício que tinha luzes no seu interior. Não encontrei qualquer porta aberta e cheguei à conclusão que se tratava de uma casa particular. Saio e vou verificar a placa. É quando vejo que tinha a tal indicação de direcção, precisamente para a estrada donde tinha vindo. Verifico depois que  aquela vila era Esterençuby e que tinha passado o refugio à pelo menos 5 km. Telefono para a São e foi difícil explicar onde estava, porque elas andavam no meio do campo no trilho à minha espera. Quando lhe disse o que já tinha descido é que percebemos que estava já bem à frente. Ainda lhe digo que vou continuar até St Jean, mas perante a insistência dela e o facto de pela segunda vez pagar estadia para mim e falhar, lá me convenceu a voltar para trás. Vou subindo e elas vêm ao meu encontro. Tinham tenda montada e jantar. Chego já tarde e vamos para a sala de jantar do refúgio. Tomo um banho e enquanto janto a São faz o tratamento aos pés que cada vez estão pior. Programo dormir cerca de 4 horas.
DIA 15
Como programado, por volta das 5 horas ponho-me ao caminho. Agora já conhecia o percurso com excepção daquela parte onde me tinha enganado na véspera. Foi reconhecendo os vários locais onde tinha já passado e assim chego à vila. Depois de atravessar Esterençuby viramos à direita e iniciamos uma subida não muito longa. Sensivelmente a meio encontro o Daniel que tinha dormido pouco antes de refúgio. O Daniel normalmente dormia ao ar livre com um bivac. Começamos a descer para as povoações que antecedem St. Jean. Alternávamos trilhos e estradas de alcatrão. Esta zona, que antecede o CP20 é relativamente plana. Ainda fizemos uma paragem junto a uma bica de água, para comer qualquer coisa porque este tipo de terreno plano parece mais cansativo que o sobe e desce. Mas ao amanhecer entramos em St Jean e na rua principal o CP20. Paro só o tempo necessário para tomar o pequeno-almoço. Queria fazer os dois CPs hoje e se possível o pouco do último troço. 

O CP21 ficava a cerca de 17 km com uma subida de cerca de 800 m D+ e uma descida para o mesmo nivel. Ainda houve tempo para pequenos desvios do trilho quando seguia por uma estrada de alcatrão e não detectei um corte à esquerda por um trilho bem inclinado e técnico.
 
Está cada vez mais perto.





Depois de entrar nos carris foi só apreciar a paisagem povoada com muitos cavalos e descer calmamente até à entrada de Baigorry onde encontrei a Glória. Pensava que estava quase, mas à entrada da vila uma placa indicava que o CP estava a 2 km. A Gloria confirmou que tínhamos de atravessar toda a cidade e subir um pouco. Foram 2 longos kms pelas ruas movimentadas até à saída para a montanha. A São tinha instalado o acantonamento cerca de 200 metros depois do CP21, por isso vou picar o ponto e bebo coca cola e sigo para o almoço que me esperava e uma sesta à sombra. Fazia muito calor e era 2h da tarde.
Enquanto descanso passam vários atletas entre os quais o casal italiano que chegou a andar vários dias com o João Oliveira. Cerca de 2 horas depois parto ao ataque do penúltimo CP que fica a 16 km. Iniciamos com uma subida até atingir um trilho muito técnico e por vezes perigoso a meia encosta. Ultrapasso o casal italiano que seguia já com alguma dificuldade devido ao calor. Voltávamos a uma subida, agora mais acentuada e técnica com uma vista fabulosa e com um precipício enorme à nossa direita que nos facultava uma vista aérea espectacular para os campos de pastoreia lá em baixo. Seguimos com este cenário durante vários km. A meio do percurso encontro num cruzamento de trilhos um grupo de caminheiros. Em frente visualizava uma subida enorme e à direita por onde eles iam seguir era a descer. Pergunto se o GR10 era por ali e disseram-me que não, era em frente e riram. Não achei muita graça, mas depois percebi porque. Aquilo por ali acima não era pera doce. Continuamos com o mesmo cenário até atingir o ponto mais alto onde estavam elementos que identifiquei como ligados à organização e que estariam a ver se estaria tudo bem.



Inicio agora a descida suave inicialmente e depois mais acentuada, até encontra as primeiras casas. Ainda ultrapasso um atleta que não tinha visto até ali e já muito próximo do CP encontro a Gloria. Foi já com alguma emoção que entrei no último CP.

Chego aqui mais cansado do que esperava, por isso decidi fazer o descanso e sair por volta da meia noite para o ultimo dia. A São e a Gloria também vão dormir aqui no pavilhão, mas elas optam por ir só fazê-lo depois da minha partida. Pouco antes da meia noite, levanto-me e vou fazer o penso aos pés conforme tinha combinado com as meninas da protecção civil. Já estavam a dormir e acordam mas limitam-se a fazer um penso simples.


DIA 16 – ULTIMO
A jornada final começa pouco antes da 1 da manhã. São cerca de 70 km que pelo perfil parecia fácil. Ninguém tinha descansado aqui e seguiram enquanto eu dormia, o casal de italianos e o Belga e o francês.
Inicio a subida que me surpreende pelo grau de dificuldade e perigosidade. Foi com muito cuidado nestas zonas porque não queria por em causa a chegada a Hendaye. Algumas partes equipadas com cordas, não eram propriamente o melhor percurso para fazer por volta das 2 da manhã, completamente sozinho e com o desgaste de 15 dias nas pernas. Passo essas partes de grau de dificuldade elevado e entro num planalto de trilho fácil. Começo a ver luzes de frontal ao longe o que me provoca um efeito anímico positivo. Pouco a pouco vou-me aproximando. São os italianos. Ultrapasso-os e rapidamente ganho avanço. Vejo nova luz que alcanço pouco depois. Nova ultrapassagem, mas não cheguei a perceber de quem se tratava. Começamos agora a descer para Ainhoa, uma vila muito bem cuidada mas que aquela hora (seriam umas 4horas) não apresentava qualquer sinal de vida. Ainda erro a saída e sigo pela estrada principal quando deveria virar à direita dentro da vila. Volto atrás e lá estava a marcação. Uma placa informava que faltavam 13 km para Sare. O percurso era completamente plano e alternava estradões com pequenos trilhos. Começo a ver luzes à frente que vão ficando cada vez mais perto. Eram o Belga e o Francês. Este duo que não se conheciam antes da transpyrenea, juntaram-se a partir do CP4 e não mais se separaram. Deviam faltar cerca de 4 km para Sare e seguimos juntos para ir tomar o pequeno-almoço nesta vila já ao amanhecer. Subimos uma escadaria na abordagem à vila e ainda desviamos para um trilho, mas em pouco tempo estávamos nas ruas de Sare. Aqui aparecia uma informação da prova com uma seta a indicar Hendaye. No centro da vila preparavam-se as esplanadas para mais um dia a receber turistas. Perguntamos se já estavam a servir o pequeno-almoço e direccionaram-nos para uma pastelaria que ficava mais à frente. Chegamos, deixamos as mochilas numa mesa exterior (com o nosso cheiro, no interior podíamos espantar a clientela), e fomos pedir ao balcão. O belga começa a pedir, e ao ver aquilo que ele pedia fiquei na dúvida se estava a pedir só para ele ou era para todos. Pediu vários tipos de bolos (pelo menos 4), mais 2 Kit-kat e ainda outro chocolate. Como o francês pediu logo a seguir outro tabuleiro composto, tive que acompanhar, mas só com 2 bolos. Nesta fase nós tínhamos sempre fome e comíamos tudo o que aparecesse. O francês ainda voltou para reabastecer, mais já tinham esgotado os bolos. Ainda repartiu comigo um último que restava.
Com a barriguita composta partimos ao ataque à subida de La Rhune. Há uns 3 anos tinha feito esta subida mas a partir da estação do comboio turístico. Pensava que iríamos passar mesmo pelo ponto mais alto e por isso achei que a altimetria estava errada e teríamos muito mais desnível. Quando interceptamos com o percurso que vinha da estação, faço uma viragem à esquerda porque conhecia esta subida. Como estava convencida que era para subir vamos a isto. Subo um pouco e começo a desconfiar. Ligo o GPS e verifico que afinal não era para subir. Mais uma vez perdido mas ainda não seria a última. Volto ao trilho que ainda se sobe um pouco e no ponto mais alto vemos pela primeira vez a linha de costa e o destino, mas ainda estamos a mais de 6 horas de distância. Cruzamos com muitas centenas de turista que diariamente sobem ao Rhule. Na descida tínhamos de parar frequentemente no cruzamento com os turistas, porque o trilho é estreito.

Ao chegar ao fundo, entramos num parque de estacionamento onde, por coincidência a Glória acabava de estacionar. Tinham escolhido um local junto ao rio para a última paragem para almoço e sesta. Enquanto preparam o repasto, descalço-me e ponho os pés na água. Não aguento muito tempo porque as feridas das bolhas não se dão muito bem com a água fria. Entretanto passam os meus colegas de pequeno-almoço que pouco depois voltam atrás, para dormir aqui uma sesta antes de começar a subir. Foram as últimas 2 horas de paragem cerca de 6 horas antes da chegada. 

A placa indicadora de direcção informava que para Hendaye eram 6h30 de viagem. Subimos um pequeno monte e voltamos a descer para um vale onde se situava um restaurante com acessibilidades só por trilhos, mas que tinha bastante clientela. Descemos mais um pouco do rio e voltamos a subir, agora sim a última subida, pensava eu. Chego ao alto e vejo Muitos carros, autocarro e casas de comércio ao longo de uma rua que sobe do outro lado do monte. O GR10 encaminha-se para lá. Quando chego à entrada hesito e sigo por um trilho à direita dessa rua. Depois de cerca de 200 m verifico pelo GPS que o mais provável é ser mesmo pela rua. Atalho a subir pelas traseiras de uma das esplanadas e aproveito para descansar e hidratar com uma cerveja fresquinha, que o calor aperta.
Continuo a subir agora pelo alcatrão até ao fim desta zona comercial espanhola implantado sobre a linha de fronteira. Ainda uma descida e nova subida até um cruzamento de trilhos onde para a direita tínhamos uma subida enorme e em frente era plano. Começo a subir e cruzo com um atleta que vinha a descer em treino. Pergunto-lhe se ia bem por ali. Ele diz-me que o antigo GR10 era por baixo, para eu voltar por lá que era muito mais fácil e em pouco tempo estaria em Biriatou. Fui ainda tentado a fazer o que ele recomendou, mas depois de hesitar decidi subir pelo trilho marcado e não me arrependi. 

A vista sobre Hendaye deliciou-me só por pensar que o objectivo tão desejado estava ali tão perto. Ainda umas fotos com os cavalos selvagens e início a descida a “grande” velocidade. O caminho era pedregoso e irregular, mas tinha trilho pelo meio dos arbustos que o ladeavam e que eram mais amigos dos meus pés. Num determinado ponto da descida, meto por um desses trilhos à direita do caminho e azar meu, precisamente nesse ponto havia a viragem à esquerda. Sigo por ali abaixo e só quando pressinto que me vou a afastar do objectivo recorro ao GPS. Claro que estava num outro GR. Volta para trás que agora tens de subir. Não chego mesmo ao cimo, porque vejo no GPS que o trilho passa ali ao lado e mesmo com o mato consegui atalhar e pegar no caminho direito.

 Mais uns minutos e estava em Biriatou. Procuro o trilho junto à igreja e é só descer mais um pouco e apanhar uma subida em alcatrão com uma inclinação que era dispensável nesta altura, mas já cheirava a meta. Vamos embora ao seu encontro. Passo por debaixo do auto-estrada e mais uma subida. Isto está quase. Telefona o Orlando Duarte que estava em frente ao computador à espera da minha chegada. Digo-lhe que está quase, estimo uns ¾ km e já está. Acabo de desligar o telefone e cruzo com um francês que passeava o seu cão e depois de palavras de incentivo, me informa que a ponta da praia de Hendaye estaria a cerca de 10 km. Nem queria acreditar. Mas não é que ele tinha mesmo razão. Durante uns km ainda fui metendo na cabeça que o homem não sabia, mas quando encontrei a Glória e o Beta que me dizem estarmos a 5 km da meta, confirmou-se a informação do francês.

Este encontro a 5 km da meta foi a confirmação do verdadeiro cheiro a meta. Comecei a correr mais um pouco, mas parecia que os kms eram enormes. Entramos num percurso de bicicletas junto à marina e ainda faltam 3 km. Atravessamos para a marginal que me pareceu não ter fim. Era tarde de praia e a rua estava cheia de gente. Não se conseguia correr no passeio, por isso íamos na pista das bicicletas. Começamos a ver o pórtico lá bem ao fundo. Passamos pela barraca dos gelados e deu-me uma vontade de parar para comprar um, mas havia fila e decidi continuar. Encontramos a São que seguiu comigo e conseguia correr a maior velocidade que eu. E finalmente depois de 366h29 chego ao objectivo que nunca imaginei ser possível concretizar.   FFFFFFFFFFFIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIMMMMMMMMMMMMMM





O Beta abre o champanhe e está consumado o meu maior desafio.
Se tinha dúvidas se consegui, claro que tinha.
Se desde que comecei o desafio alguma vez pensei que não ia chegar ao fim? Não, nunca me passou isso pela cabeça


Alguns dados:
·         Começo da preparação com a pré-inscrição cerca de 20 meses antes (fim de 2014)
·         Primeira lista de pré-inscritos com 7 portugueses (Jorge Mimoso e António Silva incluídos)
·         Inicio das prestações no 1º trimestre de 2016.
·         Custo da inscrição – 915€
·         Alimentação liofilizada – 292€
·         Deslocações  e estadia – 200€
·         Equipamento especifico
o   Mochila – 80€
o   Poncho – 45€
o   Double Light Sticks – 10€
o   Saco cama – 70€
o   Sapatilhas – 126€
TOTAL: 1738€

o   Ao João Oliveira, Jorge Serrazina, Paulo Grelha e João Colaço
Há um verbo novo: 
“transpirinear”
Que poucos num povo
Podem conjugar.
Palmilhar com gana
O "pescoço da Ibéria"
Mais de uma semana
É coisa bem séria
"- Quase 900 (!)
Do Creus à Biscaia
Muitos os tormentos
Espero não dar raia
E pensei baixinho:
“Se errar, que se f…”
Pus-me a caminho
Fiz aquela merda toda."
Parabéns Ultracampeões.

                        Fernando Andrade